Rua João Rudge – 21/Mai/1913.

      A história moderna da Casa Verde começa na manhã de 21 de Maio de 1913, quando, há exatos 104 anos, o português J. Marques Caldeira comprou o primeiro lote urbano colocado à venda, na esquina das ruas João Rudge e Saguairu, conforme conta Aureliano Leite no livro Pequena História da Casa Verde.  Mas tanto antes quanto depois dessa data, a Casa Verde é repleta de histórias variadas, pitorescas e cheias de personagens que enriquecem a fama e a tradição desse bairro, tão próximo do centro da cidade.

  

Vista do Corpo de Bombeiros da Casa Verde e da Ponte do Limão (que fica na Casa Verde)Vista do Corpo de Bombeiros da Casa Verde e da Ponte do Limão (que fica na Casa Verde)

 

NASCIMENTO – Quis a sorte que o mineiro Aureliano Leite, político e escritor, casasse com Dulce Rudge, uma das filhas do pioneiro João Rudge. Essa proximidade familiar o fez acompanhar os esforços para transformar aquele grande lote de 200 alqueires de terra, do outro lado do rio Tietê, em um empreendimento lucrativo para a família.  Em sua biografia Aureliano recorda que em 1911 visitou as terras, e ficou conjecturando com o cunhado Horácio Vergueiro Rudge sobre como transformar aquele terreno no “bairro mais lindo de São Paulo”.  Mas ambos também percebiam a falta de recursos para isso.  Os esforços continuaram e finalmente em 1913 o bairro Villa Tietê nasceu.   Porém o padrão do empreendimento não foi o desejado pois, como contou Aureliano Leite, o cheiro e o “lixo disputado por milhares de urubus esvoaçantes”, na beira do rio Tietê, afastava os interessados mais abastados.

 

Jardim São Bento.Jardim São Bento. Passista da Unidos do Peruche.Passista da Unidos do Peruche.

 

NOME – Villa Tietê era o nome do loteamento comercial, que foi lançado com as ruas João Rudge, Saguairu, Casa Verde (hoje Bernardino Fanganielo), Jaguaretê, e as praças Baroré e Centenário, todos esses nomes escolhidos pelo prefeito Washington Luis, conforme relata Aureliano.  Porém, para sorte da tradição futura, o nome “Villa Tietê”, ainda que conste de documentos e mapas antigos da cidade, não “colou”.  Vingou o nome Casa Verde, que remete a usos ainda mais antigos dessas terras ao Norte da cidade.

 

CASA VERDE – Se hoje o bairro está próximo do centro, ligado pelas avenidas Rio Branco e Rudge, no século 18 chegar a essa região era uma verdadeira aventura, e ainda se considerando que o rio Tietê tinha uma enorme várzea alagadiça.  Pois foi naquela época, por volta de 1770 e 1790, que as famosas sete “meninas da Casa Verde” iam passear no sítio ali localizado, de propriedade do irmão, o conhecido militar José Arouche de Toledo Rendom, que também era proprietário de terras na região do Largo do Arouche, onde plantava chá.  Essas irmãs moravam próximo ao Pátio do Colégio, e essa casa no centro, sim, é que era verde, conforme apurou Aureliano.  Por serem conhecidas como as “meninas da casa verde”, do centro, levaram a tradição desse nome para o sítio de veraneio no outro lado do rio

 

Parece “interior” a 6 km do centroParece “interior” a 6 km do centro Obra parada (vide Minudências).Obra parada (vide Minudências).

 

SUCESSÕES – Essas terras teriam chegado à família Arouche Rendom após terem sido propriedade do bandeirante Amador Bueno, que teria chegado a instalar nessas terras um moinho de trigo e uma habitação no estilo “casa grande e senzala” na região do Parque Peruche, ainda no distante século 17.  Após as “meninas”, já no século 19 essas terras passam por um hiato de documentação proprietária, até que por volta de 1850 novos proprietários se sucedem:  Francisco Antonio Baruel, Fidelis Nepomuceno Prates, Joaquim Floriano de Araujo, João Ribeiro da Silva, Manfredo Mayer, até que finalmente, em 1882, toda a gleba de 200 alqueires foi adquirida por João Rudge.  E seus filhos, 31 anos depois, lotearam a terra, iniciando a fase moderna da Casa Verde. 

 

LIVROS – Lançado em 1939, o Pequena História da Casa Verde é certamente um dos mais antigos livros escritos a partir de pesquisa histórica de bairros em São Paulo.  Aureliano Leite contou em sua biografia que finalizou esse livro na prisão em que ficou confinado, por discordar de Getúlio Vargas e seu Estado Novo.   Em 1998 foi lançado o livro São Paulo Tem a Casa Verde, por Eduardo Britto.   Em 2000 Marcio Michalczuk Marcelino lança o A Evolução Urbana do Parque Peruche e Sua Gente.  E juntos esses dois escritores lançaram em 2013, celebrando o centenário do bairro, o livro Eis Aí a Casa Verde, repleto de fotos inéditas.  Fica assim a Casa Verde, no passado e no presente, bem guarnecida de informações que vão informar e entreter os apaixonados pela história da cidade de São Paulo, da qual a Casa Verde é um pedaço muito rico.

 

Vista da cidade a partir da Casa Verde Alta.Vista da cidade a partir da Casa Verde Alta.

 

Minudências:
@ A primeira ponte de madeira foi construída em 1915, pela empreendedora família Rudge. A atual ponte de concreto é de 1952.
@ Uma curiosidade:  a ponte de madeira foi construída no exato alinhamento da avenida Rudge e da rua João Rudge, formando uma reta única.  Já a ponte de concreto foi construída para atravessar o rio Tietê em um ângulo de 90º, perpendicular, o que quebrou o alinhamento anterior.
@ A Ponte da Casa Verde tem hoje o nome complementar de “Jornalista Walter Abrahão”, famoso locutor de esportes, que também foi vereador na cidade, e morava no bairro.
@ A Ponte do Limão, que na verdade também se situa na Casa Verde, ganhou o nome complementar de “Adhemar Ferreira da Silva”, maior competidor olímpico de atletismo no Brasil, com duas medalhas de ouro no salto triplo.  Ele nasceu e viveu na Casa Verde até falecer, em 2001, aos 72 anos.
@  A Casa Verde revelou para o Brasil e para o mundo uma série de personalidades, como o lutador de boxe Eder Jofre, o campeão olímpico Adhemar Ferreira da Silva, o jogador de vôlei Montanaro, os jogadores de futebol Basílio e Serginho “Chulapa”, entre outros destaques.
@ Adoniram Barbosa compôs a música Morro da Casa Verde, em consideração ao samba e à negritude da região, sobretudo no bairro do Parque Peruche.
@ No surgimento do bairro, muitos dos primeiros moradores eram portugueses.  Posteriormente, já ocupando o Parque Peruche, vieram os negros e japoneses.  Ultimamente muitos bolivianos têm vindo morar na região.
@ A Casa Verde é o nome do bairro principal, e que dá nome também ao distrito Casa Verde (divisão oficial da cidade).  Nesse distrito estão bairros como Vila Ester, Vila Baruel, Jardim São Bento, Jardim das Laranjeiras, Parque Peruche, Parque Souza Aranha, Imirim e Sítio do Mandaqui.
@ A Casa Verde é o único bairro de São Paulo que tem “três andares”:  Casa Verde Baixa, Casa Verde Média e Casa Verde Alta.
@ A Casa Verde teve uma forte ligação com bondes.  Diversas linhas de bonde serviam a Casa Verde.  A primeira linha chegou à Praça Centenário em 1922.
@ A praça Centenário é uma jóia verde incrustada no coração da Casa Verde.  Quem sugeriu o nome da praça foi o prefeito Washington Luis, para homenagear o centenário da Independência, em 1922.
@ O bairro Parque Souza Aranha, nas proximidades da Ponte do Limão, tem esse nome em homenagem à família Souza Aranha, que tinha um sítio na região, onde criava cavalos e treinava pólo a cavalo.  Essa família criou aí o time de pólo que se chama Casa Verde, que até hoje participa de competições, mas já há muito tempo mudou para o interior do estado.
@ No local em que a equipe de pólo treinava ficou um terreno vazio por décadas, que era usado para festividades e a feira livre aos Sábados.  Em 02/2015 começou ali a obra da sede do 1º Batalhão da Polícia Militar Ambiental.  Porém a obra, cuja finalização estava prevista para começo de 2016, está parada há mais de seis meses, com mato já crescendo na sua parte térrea.
@ A Casa Verde tem enorme tradição com o samba.  Estão no Primeiro Grupo do carnaval paulistano as escolas Unidos do Peruche e Império da Casa Verde.  A escola de samba Morro da Casa Verde também é destaque no Carnaval, no grupo de acesso.
@ O distrito da Casa Verde tem população de 85.624 habitantes (IBGE 2010).  Seu prefeito regional é o advogado e gestor público Paulo Cahim (veja AQUI a entrevista com o prefeito regional sobre a Casa Verde).

 

Praça Centenário, no centro da Casa Verde.Praça Centenário, no centro da Casa Verde.

 

# Matéria com apoio de Tecnolamp

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  • Linda matéria!
    Obrigado por contar um pouco da história da minha querida Casa Verde.

  • Visitante - ricardo

    Grande Rogerinho..............estamos nesta historia juntos...e juntos vamos levar o nome do bairro sempre para o alto e avante.......Estudar o bairro está sendo um imenso prazer e agradeço em nome da Cervejaria Casa Verde esta oportunidade.............estamos juntos.

    Ricardo Guarniero Rodrigues
    sócio fundador

  • Visitante - Reinaldo

    E a Mocidade Alegre? Escola de samba da Casa Verde...

  • Visitante - Reinaldo

    E a Mocidade Alegre? ...

  • Visitante - roberto ferreira pupo

    Morei até 1953 na Casa Verde na Rua João Rudge 381.Estudei no Externato Imaculada Conceição.
    Tenho boas lembranças deste querido Bairro .

  • Visitante - Thaane Pessanha

    Adorei ler essa matéria. Quanta riqueza em uma História de parte da cidade. Lugares lindos. Amei ver a foto da Praça centenária.:)

  • Visitante - Mauro Bellesa

    Nasci na rua Alpha (hoje Domingos Fasolari), em 1958. Ela e a rua Zanzibar começavam juntas e eram os caminhos de entrada para a Casa Verde a partir da ponte.
    Do lado direito da cabeceira da ponte ficava o campo do famoso Esporte Clube São José, essencial para a vida social da Baixa Casa Verde. O campo do time foi extinto com a construção das pistas da Marginal e da alça de ligação da ponte com ela.
    Não concordo em chamar o Limão como parte da Casa Verde. O Limão é e sempre foi apenas a divisa entre a Casa Verde e a Freguesia do Ó.